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A nova Lei de Improbidade Administrativa: Proteção e dignidade para os agentes

Atualizado: 5 de nov. de 2024

A improbidade administrativa pode ser definida como uma conduta ilegal praticada por agentes públicos ou terceiros que cause danos à administração pública, e promova enriquecimento ilícito do servidor ou de outros. Essa conduta viola os princípios da administração pública, prevista no art. 37 da Constituição Federal de 1988, que incluem os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Segundo Fábio Medina Osório (2012), em sua publicação na Revista de Doutrina da 4° Região, define-se a improbidade administrativa como a má gestão pública gravemente desonestas ou ineficientes, seja por ações ou omissões, dolosa ou culposas, praticadas por agentes públicos no exercício de suas funções ou em razão delas, com ou sem participação dos particulares.

Em 1992, o Presidente Fernando Collor sancionou a Lei de Improbidade Administrativa (LIA) n° 8429/1992, destinada a combater a corrupção no Poder Público e aplicar sanções aos agentes públicos. A lei tem como objetivos principais, prevenir e reprimir atos ilícitos; proteger o patrimônio público; promover a moralidade administrativa e assegurar a responsabilização dos envolvidos.

Em 2021, a LIA passou por uma reforma, estabelecida pela Lei n° 14.230/2021, uma das principais mudanças foi a exigência de dolo, ou seja, a intenção consciente de cometer a infração, para a configuração do ato de improbidade, torna-se essencial. Antes, a culpa — que envolvia negligência, imprudência ou imperícia —  já era suficiente para caracterizar o ato e para punir o servidor. Com a nova legislação, afasta-se a possibilidade de ser praticado o ato de improbidade culposamente. Essa mudança na Lei de Improbidade Administrativa é Tema de Repercussão Geral, no Supremo Tribunal Federal n° 1199, com a seguinte tese:

1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;

2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;

3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente;

4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. (grifos aditados)

De acordo com a jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a retroatividade das alterações trazidas pela Lei 14.230/2021 é limitada aos atos de improbidade culposos praticados sob a vigência da norma anterior, sem condenação transitada em julgado. 

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que as alterações introduzidas na LIA não podem ser aplicadas a casos culposos em que já houve condenações definitivas e processos em fase de execução das penas. Prevaleceu o entendimento do Relator, ministro Alexandre de Moraes, no Recurso ​Extraordinário com Agravo (ARE) 843989, de que a LIA se insere no âmbito do direito administrativo sancionador, e não do direito penal. Assim, a nova norma, ainda que mais benéfica para o réu, não retroage nesses casos. Os ministros entenderam que a nova lei somente se aplica a atos culposos praticados sob a vigência da norma anterior, caso a ação ainda não tenha transitado em julgado.

Nesse contexto, a nova legislação traz um avanço na proteção dos servidores públicos, especialmente no que tange à preservação de sua dignidade. Suas ações passarão a ser avaliadas com maior consideração ao contexto e circunstâncias em que foram realizadas. Originalmente, a culpa era suficiente para a responsabilização por improbidade. Com a reforma da lei, a necessidade da comprovação do dolo para configurar o ato assegura a proporcionalidade das penalidades aplicadas, evitando que  servidores públicos sejam punidos de maneira desmedida por erros ou falhas que não envolvam a intenção de lesar a administração pública.

A nova redação da Lei, que reformulou a antiga LIA, estabelece a necessidade de dolo específico. De acordo com Neves (2022), a jurisprudência tradicional do STJ, firmada sob a antiga LIA, entendia que o dolo genérico era suficiente para a configuração da improbidade. O §2º do art. 1º da nova LIA, superou o entendimento jurisprudencial, passando a exigir o dolo específico para configuração de improbidade. 

Pode-se fazer uma correlação entre o  Direito Penal e o Direito Administrativo, no que se refere ao Jus Puniendi, ou seja, o direito de punir do Estado. O poder punitivo deste, concretiza-se através da Administração Pública, que  exerce essa função por meio de aplicação de sanções, garantindo a efetividade da prerrogativa estatal de punição.

Além disso, o  Decreto n° 1.171/1994, que aprova o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, no Capítulo I, destaca a dignidade, o decoro, o zelo, a eficácia e a consciência dos princípios morais são primados maiores que devem nortear o servidor público, no exercício do cargo, função ou fora dele. 

A nova Lei de Improbidade Administrativa reforça a dignidade do agente público, punindo somente o administrador desonesto e que atue necessariamente com a conduta de má-fé e dolo, para que configure a conduta ilícita por parte do agente. Além disso, a exigência do dolo específico como elemento essencial para a caracterização do ato de improbidade promove uma maior segurança jurídica para os servidores públicos, que agora podem desempenhar suas funções com a certeza de que só serão responsabilizados por ações nas quais haja uma clara intenção de lesar o interesse público. 

Anteriormente a simples ocorrência de uma irregularidade, mesmo sem intenção deliberada de lesar a administração pública, poderia resultar na punição do servidor. Essa abordagem muitas vezes colocava servidores diligentes e bem-intencionados em uma posição de vulnerabilidade, onde erros cometidos por negligência, imprudência ou imperícia poderiam ser tratados como atos de improbidade, comprometendo suas carreiras e reputações. A LIA, em seu  art. 17, esclarece que a ilegalidade, sem a presença de dolo, que a qualifique não configura ato de improbidade, destaca-se a presença obrigatória do dolo para a configuração do ato ilícito.

 


Referências Bibliográficas

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htmAcesso em : 28 jul. 2024

________.BRASIL. Decreto n° 1.171, de 22 de junho de 1994. Disponível em: http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/DEC%201.171-1994?OpenDocument. Acesso em 11 ago. 2024

________.BRASIL. Lei nº 8429/1992, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, de que trata o § 4º do art. 37 da Constituição Federal; e dá outras providências. Disponível em  : https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm. Acesso em 28 jul. 2024.

_______.BRASIL. Lei nº 14.230/2021, de 25 de outubro de 2021. Altera a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, que dispõe sobre improbidade administrativa. Disponível em:  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14230.htm . Acesso em 28 jul, 2024

________.BRASIL.O dolo específico na nova lei de Improbidade Administrativa, Disponível em:https://www.migalhas.com.br/depeso/360052/o-dolo-especifico-na-nova-lei-de-improbidade-administrativa . Acesso em 11 ago 2024

________.BRASIL. STF decide que mudanças na lei de improbidade não retroagem para condenações definitivas. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=492606&ori=1#:~:text=STF%20decide%20que%20mudan%C3%A7as%20na,se%20houve%20dolo%20(inten%C3%A7%C3%A3o). Acesso em 11 ago 2024

________.BRASIL.Tese 1199.Definição de eventual (IR)RETROATIVIDADE das disposições da Lei 14.230/2021, em especial, em relação: (I) A necessidade da presença do elemento subjetivo – dolo – para a configuração do ato de improbidade administrativa, inclusive no artigo 10 da LIA; e (II) A aplicação dos novos prazos de prescrição geral e intercorrente. Disponível em : https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4652910&numeroProcesso=843989&classeProcesso=ARE&numeroTema=1199. Acesso em 31 jul. 2024

NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Resende. Comentários à Reforma da Lei de Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Forense, 2022.

O dolo específico na nova lei de Improbidade Administrativa. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/360052/o-dolo-especifico-na-nova-lei-de-improbidade-administrativa. Acesso em 11 ago. 2024

OSÓRIO, Fábio Medina. Conceito e tipologia dos atos de improbidade administrativa. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 50, out. 2012. Disponível em:


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