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Adoção à brasileira: Um Problema Jurídico e Social

Na visão popular, a adoção é um ato de amor. Mas o que ocorre quando essa prática, mesmo com intenções nobres, burla a lei? A chamada "adoção à brasileira", em que uma criança é registrada como filho biológico sem passar pelos devidos trâmites legais, expõe as falhas do sistema de proteção à infância no Brasil e traz consigo dilemas jurídicos e sociais que merecem atenção. 

Essa prática, embora ilegal, é um reflexo direto da lentidão e da burocracia do sistema formal de adoção. Famílias enfrentam anos de espera, muitas vezes desistindo diante da demora e da seletividade. Ao mesmo tempo, mulheres em situação de extrema vulnerabilidade recorrem a soluções informais, entregando seus filhos diretamente a outras famílias. Nesse cenário, a verdadeira vítima é a criança que cresce sem a garantia de um processo legal que respeite sua história e seus direitos. 

Outra razão, além do tempo de espera, que contribui com esse sistema, é a visão limitada e preconceituosa de muitos interessados na adoção. Muitas vezes, as pessoas buscam perfis específicos de crianças e acabam transformando a adoção em um processo de escolha baseado em estereótipos, ignorando o verdadeiro propósito de proporcionar um lar e afeto a crianças em situação de vulnerabilidade. 

Esse comportamento não só reduz as chances de muitas crianças encontrarem famílias como também leva alguns pretendentes a desistirem do sistema formal de adoção, visto que este não garante atender às expectativas específicas dos adotantes. Nesse contexto, a adoção à brasileira passa a ser uma alternativa, pois permite uma escolha direta, na qual as famílias podem obter crianças que correspondem a seus critérios de maneira mais rápida e personalizada, ainda que de forma ilegal. 

Diante disso, optar pelo sistema informal reforça as desigualdades e enfraquece o modelo formal de adoção, dificultando ainda mais o processo para as crianças que não se enquadram em perfis específicos, como as mais velhas ou com irmãos. Além disso, a adoção de forma irregular, embora muitas vezes bem-intencionada, reforça práticas ilegais, negligenciando o direito fundamental à transparência sobre sua origem e identidade. 

Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos.

Juridicamente, a adoção à brasileira é proibida pelo artigo 242 do Código Penal, que prevê uma pena de reclusão de até seis anos. Apesar disso, os tribunais enfrentam um dilema

no qual anular o registro pode significar retirar a criança de um ambiente familiar estável, enquanto validar a adoção irregular enfraquece o sistema e incentiva a ilegalidade. Nesses casos, prevalece o princípio do melhor interesse da criança. Os juízes precisam avaliar, o que trará maior estabilidade emocional e segurança jurídica para a criança. Apesar das dificuldades, é crucial que o sistema formal seja fortalecido para evitar que tais práticas continuem ocorrendo. 

Portanto, a adoção à brasileira, embora muitas vezes motivada por boas intenções, é um problema jurídico e social que revela falhas no sistema de adoção no Brasil. Ela não é somente uma questão de ilegalidade, mas também de um reflexo de preconceitos e de uma cultura que prioriza expectativas pessoais sobre as necessidades da criança. Em um país onde tantas crianças aguardam um lar, transformar a adoção em uma escolha baseada em estereótipos é uma realidade que precisamos combater com urgência e sensibilidade. 


REFERÊNCIAS: 

FERREIRA, Ingrid Juliane dos Santos. Adoção à brasileira e os novos rumos da jurisprudência. Migalhas, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", São Paulo, 2 jun. 2015. Disponível em: 

Adoção à brasileira: o que é isso? JusBrasil, 10 ago. 2020. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/adocao-a-brasileira-o-que-e-isso/56121948 Acesso em: 1 dez. 2024. 

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm Acesso em: 1 dez. 2024. 

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm Acesso em: 1 dez. 2024.

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