O papel do juiz ao julgar os menores infratores
- Wendy Oze
- 21 de jan.
- 3 min de leitura
Há uma série na Netflix que me fez refletir por semanas: “Juvenile Justice”. Nela, acompanhamos juízes responsáveis por casos envolvendo menores de idade que cometeram crimes ou foram vítimas de crimes. O que mais me chamou a atenção foi a maneira crua com que a juíza Shim Eun-seok trata essas crianças e adolescentes. Ela não vê como inocentes ou incapazes, mas como reflexo dos erros de uma sociedade que sente prazer em punir. No início, a série faz parecer que ela é fria e sem coração, mas quem disse que punir é algo necessariamente ruim? Pais disciplinam seus filhos não por raiva ou prazer, mas para ensinar, concordar e evitar a repetição de comportamentos relacionados.
A série aborda, de forma tocante, temas como a paternidade e maternidade, os erros que cometemos e como lidamos com eles, o respeito aos mais velhos e, acima de tudo, a ideia de que cometer um crime grave, mesmo sendo menor de 18 anos, não exime ninguém de proteção. Talvez a reflexão não seja igual à de um adulto, mas, com certeza, não será algo fácil de enfrentar.
É impressionante observar menores de idade cometendo crimes inimagináveis. Essas crianças sequer deveriam ter noção de como realizar tais atos. Quem como ensinou? Quem permitiu que desenvolvessem tais comportamentos? Por que elas cometeram esses crimes? A resposta está nos adultos. Foram eles que realizaram essas crianças. As motivações para um jovem cometer um crime geralmente têm origem em sua criação, na falta de alimentos, atenção, educação, e em traumas como abusos, luto, medo e influências negativas. No entanto, quando os pais se mostram irresponsáveis, cabe à Justiça decidir o que fazer com esses menores.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) constitui a principal referência legal no Brasil para o tratamento de adolescentes que cometa atos infracionais, garantindo que sejam aplicadas medidas adequadas às suas especificidades. Entre os dispositivos que tratam essas medidas, destacam-se os artigos 101, 112 e de 121 a 129-C. O artigo 101 estabelece a competência da Justiça da Infância e da Juventude, assegurando um tratamento especializado e diferenciado, enquanto o artigo 112 enumera as medidas socioeducativas disponíveis, que incluem precauções, obrigações de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade e internacional, entre outros. Já os artigos 121 a 129 detalham as condições e os critérios para a aplicação de cada medida, como a duração, o acompanhamento e as orientações em que podem ser utilizadas. Por fim, os artigos 129-A a 129-C introduzem mecanismos para a revisão periódica das medidas aplicadas, permitindo ao juiz reavaliar a evolução do adolescente e ajustar as determinações conforme sua necessidade. Esse conjunto normativo busca garantir que as medidas sejam individualizadas, fornecidas à gravidade do ato infracional e direcionadas prioritariamente à ressocialização e à reintegração social do jovem.
Um aspecto interessante da série é que os juízes visitam os menores infratores para acompanhar a eficácia das punições que determinaram. No Brasil, isso é algo raro. Juízes não visitam presídios, mas o artigo 129, inciso I, do ECA prevê a aplicação de medidas que incluem o encaminhamento de pais ou responsáveis a serviços e programas de apoio à família. Apesar de não haver obrigatoriedade na visita do juiz ao infrator, a necessidade de acompanhamento é evidente.
As unidades de internação para adolescentes infratores no Brasil enfrentam desafios significativos. Entre os problemas, destacam-se a superlotação, a falta de profissionais envolvidos, as precárias condições físicas das instalações e a ausência de programas educativos e profissionalizantes adequados. Além disso, há uma alta incidência de violência, o que muitas vezes dificulta a ressocialização e contribui para a reincidência criminosa. A falta de investimento público em prevenção e não atendimento integral aos adolescentes em conflito com a lei agrava ainda mais essa realidade.
“Juvenile Justice” não é apenas uma série que explora o sistema de justiça juvenil; é um espelho que reflete os dilemas sociais, as falhas na educação e a responsabilidade compartilhada entre pais, comunidade e instituições na formação de jovens. Ela nos lembra que, por trás de cada ato infracional, há uma história de negligência, desigualdade ou sofrimento, mas também a possibilidade de reabilitação. No Brasil, apesar de termos um arcabouço legal robusto no ECA, os desafios estruturais e a falta de investimento mostram que ainda há um longo caminho para que as medidas socioeducativas cumpram seu propósito de ressocializar adolescentes em conflito com a lei. A série nos convida a compensar o papel da sociedade e do sistema judicial, não apenas na proteção, mas na construção de oportunidades que possam prevenir o ciclo de violência. Afinal, a responsabilidade de mudar essa realidade é de todos nós.
Precisamos assumir a nossa responsabilidade e começarmos a fazer cada um sua parte.
Refletir sobre menores infratores me faz pensar sobre o quão difícil é para uma sociedade gerar um senso comum de valores e manter uma cultura que assegura a segurança pública, o Brasil tem um longo caminho a percorrer.
Realmente, a tarefa de julgar não é algo simples, há de se levar em conta muitos aspectos, alguns deles não contemplados pela lei. Fiquei curiosa em assistir a série!